sábado, 10 de outubro de 2009

O príncipe e o sapo.

Karol era linda, charmosa, feminina e sedutora. Sair com ela provocava admiração pública. Nos shoppings, por exemplo, onde ela e Peçonha, o seu namorado, iam almoçar de vez em quando, os olhares de admiração dos outros frequentadores eram perceptíveis e até invasivos. O atendimento que Peçonha recebia nas lojas e nos restaurantes era bem diferente quando estava com ela. As vendedoras e os garçons eram todos sorrisos e mesuras. Sem ela, era o de sempre: serviço padrão. Realmente, a beleza e aquele porte nobre abria portas. Conversar com ela era um prazer. Ela era o centro e a vida de todas as reuniões sociais de que participava. Desde quando começou a namorá-la, o conceito de Peçonha com os conhecidos subiu muito ("Diz-me com quem andas e direi quem és"). Além de ter este impacto social maravilhoso, Karol era carinhosa e boa de cama. O que mais um homem poderia querer? Peçonha ficou fascinado por ela.


Sete meses depois do primeiro encontro, lá estava ele morando com Karol. Ela tinha dois filhos de seu casamento anterior, que moravam com ela. Foi aí que Peçonha começou a descobrir que o convívio exige muitas outras qualidades além do encanto pessoal, boa imagem social, romantismo e sexo selvagem.


Após sua separação, Karol tinha perdido todo o seu dinheiro. Atualmente ela tinha dívidas impagáveis para o seu nível de rendimento. Apesar disso, ela não abria mão do seu nível de vida.


O relacionamento do ex-marido e Karol com os filhos era outra fonte de problemas. Ele destratava os filhos, fazia chantagem econômica quando era contrariado por eles e os obrigava a conviver cada hora com uma nova namorada. Karol chorava muito cada vez que um filho sofria alguma agressão por parte do pai.


Peçonha percebeu que a convivência com Karol era muito mais complicada e tensa do que imaginava. E resolver essa situação não era nada fácil. Sair dela também não. Estava em uma enrascada.

Outros casos deste tipo, onde uma pessoa assume compromissos amorosos prematuros e baseados apenas em algumas características fascinantes do parceiro, ainda podem ter conseqüências mais graves do que este do Peçonha. Por exemplo, atendi uma moça que ficou fascinada por um rapaz assim que o conheceu. Ele era gentil, divertido, amistoso, romântico e bom de cama. O único defeito que ela identificou nele no início de namoro é que ele bebia um pouco além da conta. Ela logo se apaixonou perdidamente por ele. Pouco tempo de se conhecerem começaram a namorar. Seis meses depois do início do namoro foram morar juntos. Estavam morando juntos havia dez meses, quando aconteceu um incidente grave entre eles que a fez procurar o meu consultório. Assim que ela chegou observei que o seu rosto estava todo marcado por hematomas. Parecia que ela tinha sido atropelada por um caminhão. Logo no início da sessão ela contou, chorando e soluçando, que tinha sido agredida ferozmente pelo companheiro embriagado por um motivo fútil e que ele a tinha colocado na rua, praticamente só com a roupa do corpo.

Estes dois casos mostram que existe uma tendência, por parte daqueles que estão iniciando relacionamentos amorosos, para superestimar a importância da aparência dos parceiros e uma tendência para subestimar o que acontece em outras áreas da vida do parceiro, inclusive em áreas que serão essenciais para o futuro convívio. Esta tendência foi constatada por uma pesquisa realizada por Elaine Walster e seus colaboradores da Universidade de Wisconsin no início da década de 1960. Esta pesquisa, denominada “O baile do computador”, mostrou a grande importância que as pessoas atribuem à aparência na hora de escolher um parceiro amoroso. Os participantes da pesquisa eram estudantes que estavam iniciando a faculdade. Estes estudantes foram convidados para um baile onde os pares seriam formados pelo computador. Para alimentar o computador com os dados dos participantes, os experimentadores aplicaram vários testes (por exemplo, testes de personalidade e inteligência), obtiveram os boletins com as avaliações dos desempenhos escolares anteriores e avaliaram as aparências dos participantes. De fato estas informações não foram levadas em conta para a formação dos pares. Os pares foram formados através de um sorteio, com a única restrição que os homens deveriam ser mais altos do que as mulheres (os estudantes não sabiam disso). Durante o baile os estudantes foram entrevistados quanto às suas satisfações em relação aos seus parceiros. Depois, os pesquisadores continuaram a coletar informações sobre a continuidade dos encontros amorosos entre as duplas formadas para o baile. Os pesquisadores verificaram que o único preditor da satisfação dos estudantes com os parceiros durante o baile e o único preditor da continuidade dos encontros amorosos entre os pares formados para o baile eram as aparências dos participantes. Os outros atributos pessoais (características de personalidade, inteligência e desempenho escolar) não permitiram nenhuma previsão sobre quem ia gostar do parceiro durante o baile e nem sobre aqueles que continuariam a se encontrar com os parceiros após o baile.

A importância da aparência para a escolha de parceiros amorosos entre desconhecidos também foi verificada em um outro estudo mais recente. O objetivo deste estudo era descobrir quais atributos pessoais eram preditores da desejabilidade de cada participante. Para realizar este estudo os pesquisadores coletaram muitas informações sobre cada participante de vários encontros relâmpagos (“hurry date”). Neste tipo de encontro, vários possíveis parceiros são reunidos em um mesmo local. Cada participante entrevista um possível parceiro por alguns minutos e lhe dá uma nota de desejabilidade. Em seguida soa um sinal para a troca de parceiros. Acontece então outra entrevista do mesmo tipo com outro possível parceiro. Vários destes encontros rápidos são realizados em poucos minutos. No final destes encontros, aqueles parceiros que atribuíram mutuamente boas notas marcam um encontro. Os autores deste estudo verificaram que a aparência era o principal fator que influenciava a nota de desejabilidade dos participantes. Eles verificaram também que a grande maioria destes encontros não se transformava em namoro. Ou seja, a aparência era importante para marcar o encontro, mas não oferecia quase nenhuma garantia de que o relacionamento fosse dar certo.

As histórias e os estudos acima indicam que a aparência tem muita importância na escolha de parceiros amorosos entre desconhecidos. O convívio, no entanto, revela outras informações que são mais importantes para decidir sobre a continuidade ou o fim do relacionamento. Muitas destas informações importantes só podem ser coletadas através do convívio em diversas situações que a vida apresenta. Estas informações podem ficar inacessíveis ou ocultas quando o convívio é pequeno como, por exemplo, entre casais que só se vêem nos fins de semana e em momentos de lazer. Muitas destas informações também são mais inacessíveis quando os parceiros não freqüentam os círculos de relacionamentos do outro (parentes, amigo, colegas de trabalho). Esta carência de informações importantes sobre o parceiro também ocorre freqüentemente quando os parceiros moram em locais distantes. Quem assume compromisso sem conhecer bem o parceiro caminha no escuro. Você pode achar um caminho seguro, mas pode também cair em um despenhadeiro.

No início de um relacionamento é natural que cada parceiro tente mostrar as suas melhores qualidades e omitir as imperfeições. Isto é razoável só até certo ponto. Pequenos defeitos e incompatibilidades são inevitáveis. Mentiras e omissões graves não devem ser toleradas. Incompatibilidades graves não devem ser ignoradas. Não pense que você vai conseguir corrigir o parceiro depois do compromisso. Você pode pagar muito caro por este tipo de aposta. Lembre-se, no entanto, que quando estamos apaixonados subestimamos a importância de muitos problemas que já estamos vendo.


Não se case com um príncipe e depois descubra que levou um sapo para casa. Não tenha pressa para assumir compromissos. Examine bem e aumente as suas chances de ter um ótimo relacionamento.

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